segunda-feira, outubro 23, 2006

O Pedro Tadeu é comunista? Parece-me bem...

No sábado passado escutei na telefonia do carro (acho que é a primeira vez na vida que uso a palavra telefonia) uma entrevista ao Pedro Tadeu, director do 24 Horas.
Confesso que gostei de o ouvir.
Pareceu-me um tipo decente, culto e inteligente, com uma conversa agradável.
Aguentou firme a tanga do entrevistador, saindo airosamente das tábuas, com direito a, pelo menos, uma volta à arena.
É comunista, daqueles de carteirinha e já foi funcionário do Partido. Parece-me bem.
Afinal, mais um a confirmar que o melhor capitalismo selvagem é filho do estalinismo.

terça-feira, outubro 17, 2006

A Lei das Finanças Locais e Luiz Pacheco

O melhor do debate sobre a Lei das Finanças Locais foi o Luiz Pacheco.
Passo a explicar:
Por dever de ofício (e também por não ter emenda) dispus-me a ver ontem (segunda feira) o Prós e Contras sobre a proposta de Lei das Finanças Locais.
Devia saber antecipadamente que dali nada sairia de aproveitável. O programa foi o comício habitual, com berros e gritos sobre matérias acessórias e despropositadas.
A receita destes debates parece ser fazer uma espécie de RGA barulhenta, juntando no mesmo palco casais desavindos, que, obviamente, aproveitam o tempo de antena para discutir questões de alcofa. Tudo embrulhado pela presença de um ou dois protestantes profissionais da nossa praça (sempre os mesmos: no caso vertente, o Saldanha Sanches) os quais, do alto da sua cátedra e enfadados de morte, dizem umas larachas inconsequentes e superficiais, à laia de opinião, que não passam disso mesmo, pois jamais terão que executar alguma coisa.
Ou seja, uma espécie de Fiel ou Infiel, a armar ao pingarelho.
Resumindo, nada de substancial foi dito, e foi bem feito para mim.
Sucede que a função deitou para tarde ( terminou para lá da uma) e espalhou-me o sono.
Felizmente que há males que vêm por bem.
Desavindo com a cama, zappingo para o canal 2, e eis que me entra pela casa dentro, salvo seja, o Luiz Pacheco. Melhor dito, um excelente documentário sobre a vida e obra de Luiz Pacheco.
Para quem não sabe, o Luiz Pacheco é o nosso escritor maldito, função que o aludido desempenha com galhardia e pundonor. E anonimamente, como convém.
Nas palavras do próprio, é “o maior filho da puta vivo” ( se é que ainda está vivo, pois o figurão está há uma porrada de anos para morrer, sem o conseguir).
Encontrei pela primeira vez o nosso Luiz no século passado, na capa da revista Kapa (soa mal, mas não há outra maneira de dizer), onde, em entrevista, confessava, desassombradamente, que em matéria de catraias, gostava delas novas. E o entrevistador reconhecia que o “cabrão estava coberto de razão”.
Anos mais tarde acabei por ler na Internet a sua “opus major” – O libertino passeia por Braga, a idolátrica, o seu esplendor – a excelência da escrita e da Ideia, ao serviço do carroceiro mais desbragado. Achei que, dificilmente, alguma vez o Pacheco seria desapeado do trono nacional de escritor maldito, pois a coisa tem perenidade.
O nosso libertino, que fez da mendicidade o seu modo de vida, nunca escondeu que catalogava os seus amigos, pragmaticamente, por escalões baseados na quantidade de dinheiro que era seguro cravar-lhes. Tinha amigos de 5, 10, 20, 500 e 1 000 escudos. Ilustrando: fulano era um amigo de 5 “paus” porque se pode cravar-lhe, à vontade, essa quantia, que ele desembolsa sem chiar, mas acima disso, népias.
Apesar de ter alguns amigos de 1 000 paus, o Luiz não era tolo de os esfolar desabridamente. Previdente, reservava-os para as aflições da vida.
Talvez este sistema engenhoso e seguro, pudesse ser plasmado na Lei da Finanças Locais, sei lá.
Curiosamente, Mário Soares era amigo de 20 paus.
Certo dia, um jornalista sem imaginação perguntou-lhe o que diria aos jovens escritores que estão a começar.
- Puta que os pariu! – respondeu o Pacheco.
Do melhor!
De maneiras que é assim.

P.S. Acho que ainda vou escrever qualquer coisa a sério sobre a Lei das Finanças Locais.
A minha vida dava--------------> uma grande volta ao bilhar

terça-feira, outubro 10, 2006

Uma dúvida que me assalta

Qual dos dois é o melhor filme que já vi?

O Fabuloso destino de Amélie


Amarcord


Curiosamente, ambos versam, indirectamente, os benefícios do tabaco.
Num, a vantagem de ter uma caixinha de charutos. ( Amélie)
Noutro, a vantagem de ter uma tabacaria por perto. (Amarcord)

A minha vida dava ----------> duas longas metragens

quarta-feira, outubro 04, 2006

Camera Obscura: Eles estão preparados

A boa notícia é que os Camera Obscura, aparentemente, estão preparados e respondem à dúvida do post anterior. Quem sabe lhes esteja reservada uma entrada no dicionário na próxima edição. O concerto do mundo saíria ligeiramente beneficiado.
(vide post antecedente)

A minha vida dava--------> uma banda sonora: Camera Obscura "LLoyd, I'm ready to be heartbroken"

terça-feira, outubro 03, 2006

O amor? - Vem no dicionário.

amorEu gosto do Dicionário de Língua Portuguesa do Porto Editora, particularmente da 6ª edição, que está aqui aberto ao meu lado esquerdo.
Não tem pedigree. Não é um vetusto Aurélio ou um quilométrico Houaiss, nem frequenta estantes requintadas, com retorcidos em madeiras nobres. Porém, é franco e directo e não se perde em rodriguinhos nem tem hesitações semânticas, o que só depõe a seu favor. Ou seja, não lateraliza o jogo, nem atrasa para o guarda-redes.
Qual Jardel no tempo da Karen, bola nos pés é bola na rede.
Tenho para mim que o Dicionário cor de laranja, está sub aproveitado pelo género humano.
Não, não exagero! Quem se limita a lançar mão dele para resolver a ocasional dúvida ortográfica ou para decifrar a semiótica de algum cronista mais “mete-nojo”, desperdiça olimpicamente um armazém de civilização, devidamente coada de excrescências e impurezas que só nos atrapalhariam. O essencial da Natureza Humana está lá todo, resolvido e explicadinho, pronto a usar, para benefício, até, do mentecapto mais empedernido.
Então, em matéria de metafísica, o meu Dicionário é uma bênção!
Dúvida ou angústia existencial que trespasse o meu humilde espírito tem a exacta duração do tempo que demoro a chegar junto do Dicionário de Língua Portuguesa da Porto Editora.
Quem nunca comeu distraidamente uma tosta mista a magicar sobre o sentido da vida, que atire a primeira pedra! É ou não é um verdadeiro sudoku? Garanto aos não iniciados que é uma maçada das mais bravas, capaz de nos tirar anos de vida.
Mas, pergunto eu: porquê escolher a flagelação, meus senhores, se temos tudo devidamente dissecado no dicionáriozinho?
Vida: s. f.; estado de actividade dos animais e das plantas; o tempo que decorre desde o nascimento até à morte.
Com esta clareza cristalina facilmente entendemos o sentido da vida: Nascemos com o propósito de participarmos em actividades. Por isso, toca a bulir, não vá morrermos de repente. Assunto resolvido.
Então? Não falei? Chego a arrepiar-me com a eficácia do dicionário nestas questões ontológicas.
Acho particularmente interessante o caso do amor.
O amor sendo um produto da civilização, tem tirado o sono à gente civilizada.
Digo à gente civilizada, porque os outros, os bárbaros, conhecem apenas a parte prazenteira do sistema reprodutivo humano e, por isso, não têm problemas nesse departamento. Limitam-se a aproveitar a bênção, com evidentes benefícios para o seu equilíbrio emocional.
Nós, os civilizados, desde o tempo do Crescente Fértil, que, por manifesta falta do que fazer, começamos um longo processo tendente a complicar a matéria.
Reconheço que, na altura, sem os conhecimentos científicos de agora, devia ser difícil acreditar que sendo a tarefa de perpetuar a espécie tão deliciosa e remuneradora de levar a cabo, não lhe tivesse associado um custo oculto ou uma cláusula penal escondida em hieróglifos pequeniníssimos, tipo apólice de seguro. Somos desconfiados por natureza, porque disso depende a nossa sobrevivência. Por isso compreendo.
O certo é que face à ausência de indícios da existência desse custo associado, resolvemos inventá-lo, misturando culpa e angústia em doses exageradas, fórmula que, ao longo de milhares de anos, foi recebendo intrincados melhoramentos (ou pioramentos, consoante a perspectiva) e refinados contributos de toda a sorte de gente desocupada (aspirantes a poetas, porteiros, profetas, escribas, frades, gerentes comerciais, etc.), até atingir o ponto de não retorno em que nos encontramos hoje. Estima-se que, só no incêndio da Biblioteca de Alexandria, se tenham perdido 25 000 volumes, metade dos quais em verso alexandrino, sobre as vicissitudes do amor
Na verdade, a busca da natureza e essência do amor, o que quer que isso seja, transformou-se no que é hoje: um dos pilares da civilização e parte integrante do seu conceito.
No início tínhamos um honesto incentivo à reprodução, que nos era oferecido, de borla, pela Mãe Natureza, que, para tal, engendrou uma complexa interacção bio-química de ácidos e bases. Hoje temos uma teia de angústias, neuras e melancolias que nos reduzem o prémio à dimensão do ridículo.
Somos uma espécie de sucesso porque a nossa multiplicação é, incomparavelmente, a melhor coisa que se pode arranjar para fazer, independentemente da hora ou das condições atmosféricas que se façam sentir.
Fosse a perpetuação um mero dever e, relapsos como somos, cedo cederíamos aos encantos de uma qualquer Playstation fornecedora de adrenalina portátil, caminhando alegremente para a extinção da espécie.
Pena que, quando a derivação do propósito do amor se iniciou, lá para os finais do Neolítico, não houvesse um Dicionário Porto Editora à mão.
Página 95 – Amor: s.m. sentimento que nos impele para o objecto dos nossos desejos. Nada mais simples. Caso encerrado, pois o amor vem no dicionário.
Tínhamos sido poupados a muito sofrimento sem sentido. E mais, a muita literatura enjoada, o que não é, de todo, despiciendo.
Quando muito, sobrar-nos-ia a perplexidade de LLoyd Cole, literalmente:
Alguma vez estaremos preparados para que nos quebrem o coração?
Suspeito que a resposta seja negativa.
É que não vem no dicionário.


A minha vida dava ------------> uma banda sonora: misturar com LLoyd Cole & The Commotions “Are you ready to be heartbroken?”